quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Chama e Topázio

É sobre o silêncio
a compostura, o prumo
e o enveredar pra vida
sem a regalia
de aferir o rumo.

E sobre a soltura
o lastro, o cimo a iguaria
preferida, o temperar
constante infindo,
que é Sabedoria.

Então eu me aproximo!
E o mais me escapa
entre o valor da paciência
e a humildade que encapa
na clarividência.

Algo sobre o orgulho,
o ermo, o menosprezo
alheio, e o limite; a poda,
o feio, a parte deformada
e o todo enfermo.

É sobre micro, macro
universos implodidos,
meditação, despojo
e os versos e reversos
escandidos.

É sobre saber, intuição,
o estômago e a fome;
sobre o digerir,
a gestação, o âmago
e o meu nome.

Sobretudo a compostura!
O zelo! A pálpebra
e a claridade, ser e estar,
a estrutura e o lar
o universal e o particular

Salienta o silêncio,
o som, a poesia, a fervura,
o caldeirão, a temperança ,
a ira, o ritual, a dádiva
e a bruxaria.

É sobre um tudo,
e um nada que resulta
da ruminância
e o regurgitar sonoro
de uma alma estulta.

É sobre o legado
o descompasso, a prece
a messe, o entremeio;
sublimação, e o passeio
deste a outro estado.


Sim, é a eternidade,
o bem, o belo, o bom,
o ambíguo e a palavra,
o amplo e o exíguo,
receptáculo e larva.

Einstein e relatividade!

É. Quando um anjo adeja
há vórtices, derramamento,
e entrevê-se a trama,
o fio, a fortuna, o rodízio

O anjo passa
E a graça lampeja
chama e topázio

  nos olhos da moça

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Ao cretino que roubou meu MP4


Perdão, mas o senhor chegou tarde.
Meses antes dispensasse até a faca
bastava fingido um sentimento
que me poria ainda mais fraca
e disporia de um celular melhor
mobília, apartamento...

Fato é que um irmão (seu de fato)
passou antes e só pude entregar
esse contemporâneo artefato
que o senhor chamou de fone.
Permita-me informar
que ele armazena dados
e atende por outro nome.


Este informe me fez lembrar
- e não tome por deboche-
meus trabalhos acadêmicos,
e por associação um pintor
chamado Bosch. Pode estar
fora da sua alçada
a sacada dessa rima,
mas de qualquer maneira
o senhor vai tomar no rabo
pois levou o aparelho
mas deixou o cabo. 

Esse fruto do meu suor
que na sua mão é desperdício
vai custar mais que a metáfora
Sobre inferno e orifício.
Garanto que o senhor paga
e pela ameaça de “furo”
o seu futuro é notícia
na forma rítmica da praga

Desejo sinceramente
que o senhor nunca se redima
dessa sua lida ordinária
e continue incompetente
assaltando estagiária.
A justiça poética
do honorário mixo por hora
é saber que não há nada
pro senhor levar embora. 

Ah, o senhor vai saber
o quanto o mundo é cruel
sendo sempre tripudiado
por uma moça bem vestida
a revirar na bolsa papel.
Miserável ludibriado
por essa horda feroz
de estudantes descolados
e freqüentadores de brechós.

Considere-se amaldiçoado
a ter amplamente divulgado
em jornal, cordel, facebook
que o senhor é um pateta.
E toda vez que o acontecido
ameace ser esquecido
que o senhor cutuque
novamente algum poeta.
 
Iriene Borges

quinta-feira, 10 de março de 2011

Marca e estilo

Pouco, rasgado na nuca. E pequena. Fácil e certo seccioná-la em pedaços. Bem miúdos. Estratégico reduzir a semelhança no desarranjo das partes. Começo entre as maçãs e as sombrancelhas, traço que nunca reparei mais incisivo.  Sempre me detiveram pálbebras encavadas numa profundidade insidiosa de onde salta a indiferença, brancura mortiça a acuar a íris.  Separo o nariz, esnobe no conjunto. "A desproporção transmutada em charme numa moldura chanel" penso ao medir o queixo, talho seguinte. E é nessa deixa que o cabelo sutura o gesto e propicia o lapso no qual ela escapa.  A muralha de MDF é intransponível quando a graça diminuta ruma à saída,  alheia ao meu olhar afiado. "Tem esse corte aquela que ocupa meu lugar" grito no oco que era antes meu interior. Cinco séculos caberão num segundo até que uma voz recolha meus cacos do balcão.


Iriene Borges

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Adiamento

Eu espero o amanhã.
Hoje não. Hoje há medo
espreitando-me a alma
Hoje o trivial, a rotina.
Amanhã o extraordinário,
a vida que vale a pena.

Hoje a carne flácida
caída no lençol sujo
não merece a glória
da experiência plena
desse amor ideal
ou desse poder criador
dando-me asas
para alcançar a essência
do que é matéria inerte
e forma aparente.

Hoje não. Hoje o choro
contido como um segredo.
Pois essa vida medíocre,
é simples e previsível
mas também mete medo,
que é o medo do nada
além de dia após dia
viver um dia após outro
esvaindo-me aos poucos
numa resignada agonia.

Amanhã, amanhã quem sabe
eu seja diferente.
Hoje eu sou a minúscula
e insignificante partícula
da grande massa
na qual posso sumir
sem precisar pensar.
Na qual posso me esgotar
até o esquecimento
da liberdade de sonhar,
da maldição de querer
o que não posso me dar.

Hoje é melhor morrer
sem precisar me matar.
Morrer assim, calada
sufocada no buraco
do meu próprio não-ser
ouvindo-me respirar.


Iriene Borges

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Instantâneo




Há quem diga cisne
há quem diga borboleta
e há ainda quem aponte
a exuberância
prestes à implosão
e ávida por existir- ainda-
que há quem diga cinza
e há quem diga alma

Talvez eu conte da metáfora
que veste bem, e fascine
a carapuça delicada
do sujeito à gente errada
se aferir  privilégio maior
do que o engano
e a metamorfose  

Talvez desponte o fio
do escuro que seda
e eu não corra
só me enrole e durma
significando despertar
sem corpo mole ...amanhã.

Inconsistente
o meu papel medíocre
pede grafite macio
e adia tudo

Já perdi a hora e o prumo
em mensagens cifradas
sem demandar resposta
a minha melhor proposta
veio da última visagem
“escrever para a posteridade”

Mas ainda estudo.


sábado, 12 de fevereiro de 2011

Miguel é uma mensagem



Será fim de trégua
maroto Querubim
aviltares outra vez
o teu Trono na poesia
suscetível ao incêndio
É implícita a cortesia
na aquiescência
às Dominações do silêncio

Uma mulher talvez despreze
talvez estraçalhe à unha
mas a minha alcunha
é uma Potência
que não se acomoda
em definições de Virtude
ou vício

Meu verso é um Principado
cuja soberania te concedo
Se não tens amor
deixa-o vago e branco
resguardado na saudade
que não se sabe

Aceita o arranjo que me cala
o que me custa
mas a vida não é justa
nem tem bula ou atenuante
Só poupa-me à ira
que macula este semblante
e apaga a lembrança
de ser teu Anjo

Iriene Borges

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Mantra

Não adianta chacoalhar pelo pescoço
Idéia, resiliência, urdidura